(Prof. Ernâni Getirana, agosto de 2025)
Para não perder as terras descobertas (Brasil) para holandeses, franceses e ingleses a Coroa Portuguesa instituiu uma série de Leis, Decretos, Alvarás e Cartas Régias que determinavam como deveria ser a interiorização do Brasil, uma vez que por muito tempo os portugueses só haviam se dedicado ao litoral de Pindorama (que era o nome do Brasil em tupi e significa ‘terra das palmeiras’).
Tal processo teve início no século XVI, se estendeu pelos dois séculos seguintes, chegando até ao XIX. No caso do Piauí a pecuária foi a fator responsável pelo processo de interiorização da região a partir do século XVII. Durante muito tempo o que hoje chamamos de ‘estado do Piauí’ nem nome tinha, era a ‘terra de passagem’ de boi, a ‘terra do meio’ entre o Ceará e o Maranhão.
A criação do município de Pedro II, século XIX, é, pois, parte do processo estendido de interiorização delineado pelo governo português, embora sob a égide de uma monarquia constitucional parlamentar representativa (D. Pedro I e D. Pedro II).
O município piauiense de Pedro II faz 171 anos nesse 11 de agosto de 2025, oficialmente. Conhecido como Matões, posteriormente chamou-se Pequizeiro (como noticiado no jornal Phyauhy, de 1883), Itamaraty e finalmente Pedro II. Oficialmente também foi fundado pelos Irmãos Pereira: João Alves Pereira, Antonio Pereira de Castro, Albino Pereira e Domingos Pereira Dutra.
Mas como vimos teorizando já há algum tempo, essa explicação que traz os Irmãos Pereira, embora verdadeira, é simplista e não explica, de fato, a complexa realidade que foi a criação do que viria a ser o município de Pedro II, Piauí.
Os Irmãos Pereira eram de origem portuguesa, isto é, eram homens brancos com algumas posses, mas não eram ricos. Se fossem, fariam como os ricos da época (final do século XIX): teriam mandado outros procurar riquezas em seu lugar. Isso é, seriam financiadores da expedição e não participantes da expedição.
E dizemos ‘expedição’, pelos simples fato de que eles sozinhos, no meio do mato, cercados por animais ferozes, de dia tendo que suportar altas temperaturas, à noite o frio extremo, palmilhando relevo inóspito, cortando caminho dentro da caatinga vítrea, dormindo ao chão, tendo que conseguir comida, água, e uma série extensa de cuidados e afazeres, após percorrerem cerca de 200 léguas (?) a pé, dificilmente conseguiriam seu intento, isto é, de ‘fundar’ o que viria a ser no futuro o nosso município.
A chegada dos Irmãos Pereira
A chegada da expedição dos irmãos Pereira à região de Pedro II seguia, por tabela, a orientação da Coroa Portuguesa (séculos XVI, XVII e XVII) e que chegava até ao ‘período dos Pedros’ I e II (século XIX). Isto é, obedecia o modus operandi segundo o qual o processo de interiorização do Brasil deveria ser feito mediante a obediência de determinados protocolos.
Muito provavelmente a expedição dos Irmãos Pereira seguiu o modelo das expedições paulistas (as Bandeiras, século XVII). Estas contavam com cerca de uns cinquenta homens, dentre afrodescendentes (semi)escravizados, indígenas cooptados, mateiros contratados, batedores, capitão do mato, dentre outros, e os Irmãos Pereira, logicamente.
Faz-se, pois, necessário incluirmos, na criação/fundação do município de Pedro II, como que numa reparação histórica, os elementos ameríndio e afrodescendentes. Sem a presença deles, o que viria a ser o município de Pedro II nunca teria existido nesses moldes. Num tempo em que não havia meios de transportes como os de hoje e nem sequer estradas havia (apenas veredas abertas a facão), imaginar que homens de origem europeia pudessem caminhar por 200 léguas numa região semiárida e inóspita é, no mínimo, não querer nos ater à realidade histórica e lógica dos fatos.
Bouqueirão X Pequizeiro
O historiador Saulo Melo acrescenta que a primeira denominação do município teria sido “Bouqueirão”, homônimo de uma fazenda. Já o historiador Afonso Getirana diz que, segundo outro historiador cearense, o nome ‘Bouqueirão’ atribuído ao que viria a ser a primeira denominação do município de Pedro II foi um erro do cartógrafo, que o corrigiu na edição seguinte. Eu detectei pelo menos umas sete fazendas com o nome de Bouqueirão em minha pesquisa.
Alguns dados gerais do município
O município de Pedro II, PI, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e estatística (IBGE), localiza-se na Mesorregião do Norte piauiense, na Microrregião de Campo Maior, a 4º 25’ 18’’ de Latitude Sul e a 41º 27’ 34’’ de Longitude W, Gr. Fuso horário UTC-3.
O município está localizado no território dos cocais, na microrregião de Campo Maior. Possui altitude média de 600 m. Seu clima é tropical megatérmico e subúmido, com média 1.000 mm de chuva/ano. (IBGE, 2022).
Sua área é de 1.518 km2, bioma Caatinga, localizado a 195 km da capital, Teresina. Sua população é de 38.812 mil pessoas (22 mil na zona rural e 19 mil do total geral são do sexo feminino). A densidade demográfica é de 24,70 (IBGE, 2022), gentílico: pedro-segundense. Estatística de empresas (IBGE, 2012): 431 empresas atuantes, 1.938 pessoas ocupadas assalariados, 2.319 pessoas ocupadas no geral, salário médio mensal: 1,2 salários mínimos.
No ranking de população dos municípios, Pedro II está: na 14ª colocação no estado; na 248ª colocação na região Nordeste; e na 858ª colocação no Brasil. São em média 3,12 habitantes por residência num total de cerca de 12 mil residências (IBGE, 2022).
Para darmos uma chave temporária a este artigo, diremos, por fim, que o município de Pedro II é filho da Serra da Ibiapaba. Sua sede, estando entre quatro olhos d’água (Pirapora, Bananeira, Pimenta e Buritizinho), pode ser um forte indicativo de que muito antes dos Irmãos Pereira, pelo menos 12 mil anos antes (segundo as inscrições rupestres do Parque Arqueológico da Lapa), possivelmente grupos de povos originários seriam, ao frigir dos ovos, os verdadeiros fundadores do nosso município, assim como os povos indígenas (e não Pedro Álvares Cabral) são os verdadeiros fundadores do Brasil. Mas isso fica para se comentar uma próxima vez.
O MUNICÍPIO DE PEDRO II: seu povo, sua História, sua diversidade.
O município, oficialmente, foi conhecido como Matões, posteriormente chamou-se Pequizeiro (como noticiado no jornal Phyauhy de 1883), citado como seus ‘criadores’ João Alves Pereira e seus irmãos Domingos, Manoele o amigo Antonio. Como vimos afirmando já há algum tempo, essa explicação é simplista e não explica, de fato, a complexa realidade dos fatos.
Para tanto, faz-se necessário incluirmos, como que numa reparação histórica, os elementos ameríndios e afro-descendentes. Sem a presença destes, o que viria a ser o município de Pedro II nunca teria existido.
Segundo o historiador Eduardo Pereira, o povoado foi elevado à categoria de vila em 11 de agosto de 1854 (Lei provincial assinada pelo presidente da Província do Piauí, Pereira Carvalho. A paróquia, dedicada a Nossa Senhora da Conceição, foi instituída pela LP 295, de 20 de agosto de 1851, quando o Presidente da Província do Piauí era Antonio Saraiva. A oficialização do nome “Pedro II” ocorreu em 25 de agosto de 1855, mas com a queda do Império, o município voltou a se chamar “Matões”, em 28 de dezembro de 1889.
A vila passou à categoria de cidade em 21 de fevereiro de 1891, através do Decreto Lei nº 50, assinado pelo governador Gabriel Ferreira, com o nome de Itamaraty (palavra tupi cujo significado é “lugar das pedras cor-de-rosa”). Finalmente em 13 de junho de 1911, o município volta em definitivo a chamar-sePedro II, pela Lei 641, assinada pelo governador Antonino Freire da Silva.
O brasão do município de Pedro II
O Brasão da cidade de Pedro II, idealizado pelo artista plástico local, J. Batista, tem como características as cores azul, verde e amarelo, inspiradas nas bandeiras do Piauí e do Brasil. As carnaúbas são uma simbologia à “árvore da vida”, como é considerada no Nordeste brasileiro, onde está presente nas planícies dos principais rios do Estado, cumprindo importante função para a manutenção do equilíbrio ecológico da região.
À direita, vemos a silhueta do Morro do Gritador, numa alusão a um dos principais cartões postais de Pedro II, integrante do seu patrimônio natural. O nosso artesanato também está representado por meio da rede e da cerâmica, valorizando uma das principais marcas culturais da cidade. O livro aberto homenageia nossa literatura local, mostrando que Pedro II é também um berço de grandes intelectuais e poetas.
O violão, com galho brotando, representa o Festival de Inverno, que ganhou lugar de destaque, na última década, no calendário de eventos do Piauí e que valoriza os talentos musicais de Pedro II. Na parte externa do Brasão e à esquerda, vemos um galho florido de pequizeiro, como a representação da primeira denominação da cidade.
E à direita, o milho, representando a atividade agrícola predominante no município. Na parte superior do Brasão, estão representados a coroa do Imperador D. Pedro II, os platibandas dos casarios, marca do nosso patrimônio arquitetônico, o chapéu de couro dos vaqueiros, enriquecido com a opala ao centro, um dos mais ricos tesouros do patrimônio natural de Pedro II.
A proposta foi aprovada por unanimidade na sessão do dia 05 de agosto de 2013.
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Trarei agora um poema do poeta pedro-segundense Arimatéa Sales:
MINHA PEDRO I I
Na brisa fresca do raiar do dia,
Um café quente com cuscuz e leite,
Na merendeira, toda freguesia
Pra'quele lanche que era seu deleite.
Breve vinha da mesma padaria:
Rosca caroçuda, pão no azeite,
Panelada e pimenta, que ardia,
Ki-suco e, guardanapo, com enfeite.
E a garapa de cana e rapadura,
Maria Isabel, leitoa assada.
Muitos produtos da agricultura.
Bichos, motos e carros na calçada.
O colapso por falta de estrutura.
Tem rua comprimida, amassada.
(Arimatéa Sales . Em: 07/08/25 Fortaleza. CE).
(*) Este texto está mais ampla e profundamente escrito no livro “História, Geografia e Literatura de Pedro II, Piauí”, de minha autoria, e que pretendo publicar ainda em 2025.
(*) Fotos: Afonso Celso, Ernâni, Samuel, outros.
Autores e autoras consultado(a)s para a escrita e ilustração desse artigo:
AMARAL, Ivanilda. Mapa do município de Perdo II com base em um mapa de autoria da professora Ivanilda Amaral.
BRANDÃO, Wilson de Andrade. Formação social. in: SANTANA, Raimundo Nonato Monteiro de (Org.). Piauí: Formação. Desenvolvimento. Perspectiva. Teresina: Halley. 1995. P.13-40.
LIMA, Ernâni Getirana de. Raspa do Mameleiro: antologia de prosa e poesia pedro-segundense/organizador, Ernâni Getirana. Pedro II, PI, EDUFPI, 2015. 152p.
GETIRANA, Ernâni. O município de Pedro II, seu povo, sua historia sua diversidade (Artigo, 2012).
PEREIRA, José Eduardo. Pedro II e Domingos Mourão: coletânea de artigos. 2ª. Série. Teresina, Gráfica Editora Júnior, 1988. 76p. (Caderno 5).
SALES, Genuino. Bem na Safena. Coleção Contar-Vol9. Ed.Halley SA, Teresina, 2002.
ERNÂNI GETIRANA (@ernanigetirana) é professor aposentado do estado (ainda leciona na rede municipal de educação), poeta e escritor. Presidente da APLA – Academia Pedro-segundense de Letras e Artes, membro da UBE-PI, ALVAL e do IHGPI. Formado em Letras pela UFPI, onde também fez mestrado. Membro fundador do Coletivo P2. Pertence aos coletivos ‘Amigos da Literatura’ e Coletivo Literário de São Benedito, CE. É autor, dentre outros, dos livros de “Debaixo da Figueira do Meu Avô” e “Lendas da Cidade de Pedro II”. Atualmente prepara três novos livros, dente estes “História, Geografia e Literatura de Pedro II, Piauí”. Escreve aos sábados para o Portal P2.